quarta-feira, 14 de abril de 2010

Escrever sobre o que escrevo
não é escrever o que escrevo.
É antes, não ter
o que escrever.

Eu escrevo hoje à míngua,
difícil,
ultrapassado,
atropelado no ofício.

A escrita se tira da vida,
e a vida, de onde se tira?
A vida se tira da escrita
e se acrescenta a fome, já aflita.

Escreve-o sem o vive-o,
horrível
desnível
Drenagem de tinta já velha,
Chove e desce pela calha
da casa que é só telha.

Centelha
fricção da pedra na pedra
calo no dedo da perda.
Perdido de si, o poeta
faz ponte entre as margens
sem rio.

Viver sobre o que escrevo
não é escrever sobre o que eu vivo.
Vivo... mas não vivo.
Respiro ar sem movimento,
virando as páginas
rápidas
brancas
da vida ausente no livro.

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