domingo, 23 de outubro de 2011

A Última Gesta

Assustados, os cavalos
se embrenham na neblina.

Amanhece, sem sol,
o ricochete da noite ecoa
por todos os vales do mundo.

Não há mais homens vivos,
não há mais sedes expostas,
nem é preciso lugar seguro.

Assustados, os cavalos
pisam em silêncio no escuro.

Nada mais é necessário,
a translação, as estações,
o orvalho irreflexo seca.

Cinza, cor única, indecomponível
inaugura o fim da cegueira,
messias total da nova dimensão.

Assustados, os cavalos
suam, sem resfolegar.

Vertigem e não fronteira,
éter e não pureza,
a vida rompe a membrana.

Esvai, paira sobre as águas,
expira, manifesta... não há vetores
nem simulacros.

Assustados, os cavalos
refugam, sem existir.

terça-feira, 15 de fevereiro de 2011

Self-Portrait under siege

Um a mais, um a menos, mais letra que número, mais carne que alma. De todas as formas de se fugir de clichês eu já experimentei, mas, verdade seja dita: ...
Maldita seja a verdade, que vicia, maltrata e em pouca coisa complementa. Eu, que de tão estúpido, passo com louvor em todos os caminhos ferozes. Quando não sangro, faço sangrar e tinha sempre a resposta na ponta da língua, quando levado ao Papa. O que sou hoje só ocupa meu espaço, não sidero nem considero, embora certeiro na trajetória. Já fui homem de pão, de quarto quente, de luz acesa e toalha esticada. Hoje eu tento separar as coisas que de mim se separaram. A vida estoura, de rojão enfiado no meu ouvido, as comemorações de que não participo. Não sou gente bonita, não sorrio pra não ficar mais feio, não acho dinheiro na rua nem no bolso da calça lavada. A maioria me chama por outros nomes, que não o nome bonito que tenho. Sina do sui generis a alusão com as figuras fáceis. Sou de pequenos e imbecis prazeres, sou de música e de travessias, de pousos e esquecimentos. Quem me conhece sabe.

Mas ninguém me conhece.


01/09/09, mas podia ser de hoje

segunda-feira, 14 de fevereiro de 2011

Estudo Poético nº 2

Tensa palavra
que, de tão cáustica,
abençoa.


21/09/09

Encontro novamente o meu caminho-

estrada entre sorrisos
e olhos que me olham.

Quarentena no deserto
me fez vidro;
a sede me fez líquido...
do pó, não retorno ao pó.

Água nova da nascente
vem à foz.

Novo leito
que me espera
corre manso...

09/08/2006

Autoretrato

Pássaro
que, de infinito,
não forma bando.



13/09/09

Matemática

Inteiro,
se e somente se
dividido por dois.




30/09/09

quinta-feira, 10 de fevereiro de 2011

Serial Loser

Dois de paus na manga, encaro os jogadores nos olhos,
e, sobre a mesa, deixo a escritura da casa.

Sempre de malas prontas, pronto pra qualquer viagem
de volta.

Quixote, de pés e dentes puídos,
os moinhos me dilaceram, as ovelhas me mordem.

À mosca, não ponho medo, nem apetite.

Navegante interminável
dos naufrágios próprios,
sobrevivente das próprias ilusões,
empurrado da prancha das alheias.

Um ponto perdido no mar, entre balões,
tentando derreter geleiras.

Equilíbrio Osmótico

Nada, fora.
Pouco, dentro.