terça-feira, 16 de outubro de 2012

É minha mão...

É minha mão,
quem fala por mim,
aqui.

É ela a divina proporção,
a fronteira que conquista
tua fronteira,
a membrana do infinito.

É dela, todo poder e ostentação,
todos os sentidos
e todo sentido.

É minha mão
meu inesquecível rosto.

domingo, 14 de outubro de 2012

(Meta)²morfose

Aquilo que pousou aqui
foi nada mais que um alfinete
na gravata do meu dia.

Um brilho, apenas,
um espinho
com destino e sem caminho -

a verdade perde um botão... que cai,
rola,
dança
e repousa.

Da borboleta, brotou a flor.

A paz inexistente

Eis que,
externa ao ciclo,
uma estação cumpre a sentença.

Recolhe, lastro por lastro,
âncoras
trazidas pelo vento.

É dia de festa, na trincheira - e plumas
de pássaros terminados
estrepitam no céu azul imenso.

Soldados abraçam-se
às mães dos inimigos mortos
e entregam rosas aos futuros pesadelos.

No mar, no horizonte,
despede-se
o último sol do não-outono.

terça-feira, 17 de julho de 2012

It's just another town, along your road.

Before I Forget


Por mais que eu não queira ficar em silêncio, é praticamente por obrigação que escrevo este texto. Obrigação que o coração obriga, e não tenho como desobedecer.
Ontem, morreu a maior referência que eu tinha, depois de meu pai. Não era meu parente, não era meu amigo de infância, sequer sabia que eu existo, e vim até aqui, pra falar dele.
Porque, desde que, há uns 20 anos, eu ouvi sua música pela primeira vez, ela passou a fazer parte de mim e eu dela. Eu só sou músico por causa dela. Muitas vezes, foi por causa dela que eu fiz questão de ser alguma coisa, e foi através dela que eu fiz questão de acreditar que existe algo acima dos homens e de suas crenças, capaz de mover e purificar seus corações de carne, e de torná-los imortais. Quando tudo vertia em negra torrente para os abismos, foi sua música cheia de vida e coragem que desafiou os ventos, pra me resgatar do inferno. E foi ela quem fez tudo valer a pena. Porque, sim... ainda que não houvesse pra mim cor, sabor,calor, frio, desejo nem perfume, teria valido a pena por existir sua música, e tudo faria sentido, como continua fazendo e fará.
E é ela quem vai mantê-lo e a mim mesmo, aqui, comigo, se um dia todo o mais fugir ou se esquivar de mim.
Eu rogo pra que alcances, agora, mares menos sombrios e mais condizentes com aquilo que trazias contigo, velho mestre. Rogo para que uma mínima fagulha de tua música, tão perfeita, sublime e benfazeja possa voar de vez em quando do meu sopro, para espalhar a bênção da vida nos corações de carne, tão sofridos, carcomidos e embrutecidos quanto o meu, fazendo-os vibrar em diapasão com aquilo que de mais sagrado o homem possa trazer ao homem.
Teu lugar seja o lugar dos maiores, meu velho mestre.
Meu velho e querido Lord.

terça-feira, 17 de abril de 2012

Abril

Dispo-me da nudez perfeita
dos erros.
Sou inteiro, mais uma vez,
ao abraço balsâmico do Outono.

Manhã de céu, manhã de mim,
o sol sorve o maná que deixei, o meu caminho,
meus passos mortos, meu mortal salto, meu vôo livre.

É Outono... venço!
Há viço e voracidade, em cada pena trocada, tocada pelo vento.
Há fio novo, de corte certeiro, de chuva de flechas. Há vida sobre os destroços
dos escudos quebrados, dos casulos rasgados.
É Outono... a cavalaria chega e fende o cerco cáustico do Verão.

O Sol me envia seus diplomatas, capitula, resgata a paz,
refém de um poço de sangue
que, novamente, bombeia.

O céu anuncia, em nuvens brancas,
seu maravilhoso retorno.

quarta-feira, 4 de abril de 2012

Moiras e bungee jump (High Cai)

Cada passo
toca

(o vão entre os pés mede palmos pra Morte, imenso corredor restrito à pele, desfluido, contrito, escorre a própria légua legada, chumbo nas solas de mercúrio, mesmo parado, anda, veloz, estático, frio e profundo, salto que leva de volta ao topo, costelas expostas, obsceno, estol, estio, sol que reluta na linha, atrasa, adia, incendeia o horizonte no atrito, engrenagem acesa e cáustica, tempestade nas nuvens de granito, abrigo de fogo, imolado, sacrífico, metade de um girassol carnívoro, inane, messias alquebrado e puído, não basta ao coração dos homens em sede de farsa, corromper pra salvar, saquear o que lhe é legítimo, da porta pra fora, existe, perambula, cai, e ninguém está lá, ninguém aqui, ninguém dentro de mim, da porta pra dentro, saí pra me procurar, pedaço aqui, ali, partes não formam mais todo, esboroado, víscera estanque, vida mímica, mínima, anímica, tortura para o já confesso, brinquedo de gato, camundongo do caminho longo, mais perto, mais perto, já quase, sorriso de dever cumprido, descanso em disfarce, já quase, já chega, invade e rebenta contra as retinas, chovendo pra dentro, despressurizado, liberto, mosaico expugnado, asperso, esparso, iluminado, prosaico, coisa, caio, saio, desapareço, ascendo)


o abismo.