sábado, 23 de fevereiro de 2008

Antisalmo


Onde.

Mãos tão voláteis quanto
a alvura dos anjos.

Meu ventre seco a parir correntes.
Aços vomitados sem guarnição de tempo.

Tambores, tambores e trombetas...
esqueletos crescem no jardim.

A deriva de um corpo são
um corpo santo alvejado
pelas flechas extirpadas.

Não há dignidade quando fecho os olhos.
O escuro me
espanca...
a porta se cala...
a porta se cala.

quinta-feira, 7 de fevereiro de 2008

Texto pra foto


É... texto pra foto.

Tenho o costume de procurar imagens pela rede para ilustrar meus textos, mas desta vez, foi inevitável. Antes a foto, depois o texto. Algumas das imagens aqui do meu espaço têm até mais expressão que os próprios textos que ilustram. Creio que este será um caso desses. E vou tentando o texto pra foto. Mas... vamos olhar pra foto. Era pra ser um contraste, mas acabou não sendo. As engrenagens, se montadas e azeitadas, fariam um contraste com a flor murcha, ressequida. Máquina viva e vida morta. O cartesiano sobrepujando o fractal, a forja acima do fluir, o ferro vencendo a flor. Mas não está lá. Assim como também não se vê a flor viçosa, o perfume quase perceptível pela sinestesia da cor, triunfo da natureza sobre o progresso, como querem os musgos, líquens e ervas daninhas. As ervas daninhas são indicativo de máquina parada. Pois bem, não se vê a flor em seu cavalgar fixo expelindo cio e primavera em deboche à quinquilharia. Não há languidez a brotar do baldio da imagem, não há brotar, não há, não há. Há abortar, desbotar, descarrilar. Acabou a foto nisso. Na morte. É a foto de um crime, prova substancial e incontestável de negligência e abandono.

Não. Não é. A foto não é. Porque a destruição é, mas a não construção não é. Não há ruína, é perceptível que é apenas um cenário. Tem que ser apenas um cenário para ser. É uma montagem tosca, um arremedo, um logro, isca. É uma isca. A foto nunca aconteceu. Nada foi flagrado, um engodo arquitetado de improviso, onde o perdedor é quem vê. Eu, você, o autor e outros tantos ou os poucos que passam por aqui, todos perdedores. Perdemos o que podemos ver, o que podemos descrever e passar pros outros, fermentado ou cru, guarnecido ou comido no pé. Deparar-se com o nada e obedecê-lo, bestialmente, subestimando a força da própria existência. Em momentos como este, um ácaro, um boi perdido e o cu ínfimo de uma lombriga existem com a força tirânica de um milhão de Neros, pensam mais que toda a Antigüidade antes e depois de Sócrates e queimam em vida abundante, num jorro único de esperma existente e ultraexistente. E nós, hahaha... e nós, aqui tentando existir, parados diante da vitrine espelhada da expectativa póstuma de existir. Flor e ferro. Nada.

Voltem pra casa. Não há nada pra ver aqui.